Valentin
Há dois anos ele procurava respostas e perambulava por ali, pelos lugares mais distantes e esquecidos de Pilarium, pelo local onde se encontrava aquela biblioteca velha. Foi ali que sua vida deixou de existir, que se tornou um homem sem alma, que vagou pelo mundo como um fantasma. Só voltaria a respirar, a ser de novo completo quando sua esposa e filho fossem encontrados.
Morava em um barraco. Vivia de bicos. E buscava incansavelmente respostas. Sua alegria, sua dança, seu sorriso estavam mortos. E a sensação de acordar todo dia e saber de suas perdas era pior do que qualquer coisa. Trocara, sem que pudesse escolher, seus amores por poderes que nunca pediu. Que nunca entendeu.
Era um cigano, de uma linhagem antiga. Depois de muitas guerras, de viver sem pátria, de ser um nômade, veio parar no Brasil. Em Pilarium, trabalhou com Luna, sua companheira de toda uma vida, sua primeira e única namorada, num circo da cidade, onde fazia truques de ilusionismo e tocava músicas em um antigo bandolim.
Foram até felizes lá, apesar de viverem precariamente com o circo de um lado para outro. Em uma pátria em que havia muitos analfabetos, espetáculos fáceis de entender eram bem vistos, mas também mal pagos. E quando Luna ficou grávida, resolveram se mudar para fora de Pilarium, onde viviam outros familiares. Foi quando sua esposa sumiu.
Tinham sido atraídos até aquela biblioteca velha por um homem idoso que os abordou e disse ter uma proposta irrecusável para ele. Segundo o homem, era muito rico e queria reerguer a biblioteca abandonada, incentivar a leitura na população. E precisava de um homem letrado e culto para ajudá-lo.
Embora seu povo não tivesse escrita e o saber fosse passado de forma oral, Valentin era estudado. Sua maior paixão, além de Luna e seu povo, era ler. Aprendeu praticamente sozinho e se tornou um viciado. Passou a escrever contos, poesias, histórias maiores, que ficavam guardadas, apenas para a apreciação da esposa, a quem ensinou a ler.
Tinha um talento grande para a escrita. E paciência para recuperar livros antigos. Por isso o convite, apesar de estranho, o atraiu. Foi ao encontro com Luna, pois ela participava de todas as decisões de sua vida. Ela achou melhor saírem de Pilarium, por dois motivos: um, queria ter nosso filho no meio da nossa família; dois, era muito intuitiva e desde o início sentiu algo estranho com aquele homem. E que aquele trabalho traria problemas e tragédias.
Devíamos ter respeitado mais aquela intuição. Pois o velho que nos esperava na Biblioteca entregou-me um livro muito antigo, que fez uma espécie de luz irradiar para dentro de mim e me deixar tonto, até desmaiar. Quando acordei, Luna com meu filho na barriga, o livro e o velho tinham sumido.
Nunca fiquei tão desesperado na vida. Vaguei procurando por eles, tentei tudo que foi possível. E descobri que aquele livro maldito, além de me tirar os meus amores, me deu outras coisas em troca, sem perguntar o que eu queria.
E agora chegava aquele bilhete para mim. Do nada:
“Ao cair da noite, esteja na velha biblioteca da rua Quinta com a Santra. Assunto de seu interesse.
O meu único interesse era encontrar Luna e nosso filho, que já tinha nascido. Nunca perdi as esperanças de vê-los novamente, estar com eles, saber o que aconteceu. E corri para a maldita biblioteca, armado com dois punhais na cintura, pronto para qualquer coisa.
Entrei cauteloso, esperançoso.
Mas em vez de me deparar com minha esposa, vi uma jovem bonita de cabelos claros e um homem alto cujo rosto era muito conhecido em Pilarium e no Brasil todo, um ator.
Eles me fitaram tão desconfiados quanto eu com eles. Entrei, em busca de respostas. Disposto a tudo.
Há dois anos ele procurava respostas e perambulava por ali, pelos lugares mais distantes e esquecidos de Pilarium, pelo local onde se encontrava aquela biblioteca velha. Foi ali que sua vida deixou de existir, que se tornou um homem sem alma, que vagou pelo mundo como um fantasma. Só voltaria a respirar, a ser de novo completo quando sua esposa e filho fossem encontrados.
Morava em um barraco. Vivia de bicos. E buscava incansavelmente respostas. Sua alegria, sua dança, seu sorriso estavam mortos. E a sensação de acordar todo dia e saber de suas perdas era pior do que qualquer coisa. Trocara, sem que pudesse escolher, seus amores por poderes que nunca pediu. Que nunca entendeu.
Era um cigano, de uma linhagem antiga. Depois de muitas guerras, de viver sem pátria, de ser um nômade, veio parar no Brasil. Em Pilarium, trabalhou com Luna, sua companheira de toda uma vida, sua primeira e única namorada, num circo da cidade, onde fazia truques de ilusionismo e tocava músicas em um antigo bandolim.
Foram até felizes lá, apesar de viverem precariamente com o circo de um lado para outro. Em uma pátria em que havia muitos analfabetos, espetáculos fáceis de entender eram bem vistos, mas também mal pagos. E quando Luna ficou grávida, resolveram se mudar para fora de Pilarium, onde viviam outros familiares. Foi quando sua esposa sumiu.
Tinham sido atraídos até aquela biblioteca velha por um homem idoso que os abordou e disse ter uma proposta irrecusável para ele. Segundo o homem, era muito rico e queria reerguer a biblioteca abandonada, incentivar a leitura na população. E precisava de um homem letrado e culto para ajudá-lo.
Embora seu povo não tivesse escrita e o saber fosse passado de forma oral, Valentin era estudado. Sua maior paixão, além de Luna e seu povo, era ler. Aprendeu praticamente sozinho e se tornou um viciado. Passou a escrever contos, poesias, histórias maiores, que ficavam guardadas, apenas para a apreciação da esposa, a quem ensinou a ler.
Tinha um talento grande para a escrita. E paciência para recuperar livros antigos. Por isso o convite, apesar de estranho, o atraiu. Foi ao encontro com Luna, pois ela participava de todas as decisões de sua vida. Ela achou melhor saírem de Pilarium, por dois motivos: um, queria ter nosso filho no meio da nossa família; dois, era muito intuitiva e desde o início sentiu algo estranho com aquele homem. E que aquele trabalho traria problemas e tragédias.
Devíamos ter respeitado mais aquela intuição. Pois o velho que nos esperava na Biblioteca entregou-me um livro muito antigo, que fez uma espécie de luz irradiar para dentro de mim e me deixar tonto, até desmaiar. Quando acordei, Luna com meu filho na barriga, o livro e o velho tinham sumido.
Nunca fiquei tão desesperado na vida. Vaguei procurando por eles, tentei tudo que foi possível. E descobri que aquele livro maldito, além de me tirar os meus amores, me deu outras coisas em troca, sem perguntar o que eu queria.
E agora chegava aquele bilhete para mim. Do nada:
“Ao cair da noite, esteja na velha biblioteca da rua Quinta com a Santra. Assunto de seu interesse.
O meu único interesse era encontrar Luna e nosso filho, que já tinha nascido. Nunca perdi as esperanças de vê-los novamente, estar com eles, saber o que aconteceu. E corri para a maldita biblioteca, armado com dois punhais na cintura, pronto para qualquer coisa.
Entrei cauteloso, esperançoso.
Mas em vez de me deparar com minha esposa, vi uma jovem bonita de cabelos claros e um homem alto cujo rosto era muito conhecido em Pilarium e no Brasil todo, um ator.
Eles me fitaram tão desconfiados quanto eu com eles. Entrei, em busca de respostas. Disposto a tudo.